Qual é a sua opinião sobre o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa?

sábado, 15 de novembro de 2008

A NOVA ORTOGRAFIA - INFORME-SE!‏

ATENÇÃO!
Não deixe de se informar sobre as mudanças que ocorrerão na ortografia da Língua Portuguesa a partir de primeiro de janeiro próximo, quando entra em vigor o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, com pequenas alterações que nós, professores (e demais profissionais que têm a língua escrita culta como ferramenta de trabalho) já precisaremos utilizar.

No X CONGRESSO NACIONAL DE FONÉTICA E FONOLOGIA e IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE FONÉTICA E FONOLOGIA (http://www.hzen.com.br/client/10congresso) será oferecido um minicurso que versará sobre "A IMPORTÂNCIA DAS PRONÚNCIAS CULTAS DA LÍNGUA NO ACORDO ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA".

Outro evento muito significativo, principalmente, para quem quer ficar por dentro do assunto, é a Conferência "O Novo Acordo Ortográfico e sua Repercussão no Mundo Lusófono", ministrada pelo gramático, professor e pesquisador Evanildo Cavalcante Bechara, que se realizará no dia 27 de novembro de 2008, na UFF, Universidade Federal Fluminense.
Veja a programação:
ACORDO ORTOGRÁFICO: PARÂMETROS E IMPLICAÇÕES

17 horas - Conferência
O Novo Acordo Ortográfico e sua Repercussão no Mundo Lusófono
Evanildo Bechara

19 horas - Homenagem
80 anos de Evanildo Bechara


19 horas e 30 minutos - Encerramento

Local:
Auditório Macunaíma do Instituto de Letras da UFF
Campus do Gragoatá, Bloco C, 4º andar - Niterói - RJ

Fique atento! Vários livros têm saído sobre o tema, como:

POR DENTRO DAS PALAVRAS DA LÍNGUA PORTUGUESA, de Domício Proença Filho.

O NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO: SOLUÇÕES, DÚVIDAS E DIFICULDADES PARA O ENSINO, de Manoel Pinto Ribeiro;

A NOVA ORTOGRAFIA: O QUE MUDA COM O ACORDO ORTOGRÁFICO, de Claudio Cezar Henriques;

ESCREVENDO PELA NOVA ORTOGRAFIA: COMO USAR AS REGRAS DO NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA, do Instituto Antônio Houaiss (Coordenação e assistência de José Carlos de Azeredo);

A NOVA ORTOGRAFIA, de Evanildo Bechara.

O QUE MUDA COM O NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO, de Evanildo Bechara.

Além desses, muitos outros já foram ou estão sendo publicados para que você não fique esperando para aprender quando já estiverem cobrando de você o ensino dessas modificações. Os professores de Língua Portuguesa, assim como os jornalistas e redatores, naturalmente, terão de estar atualizados em relação a essas modificações a partir de 2009, pois os livros didáticos e paradidáticos com essas alterações já estão sendo editados!

*Leia também a nossa postagem do dia 22 de outubro de 2008. Lá tem link que você pode acessar todas as modificações feitas na nossa ortografia da Língua Portuguesa, além de estudos e opiniões sobre o assunto feitos por estudiosos da área.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

ACORDO ORTOGRÁFICO - 2ª PARTE

SOBRE O ACORDO ORTOGRÁFICO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS‏

Alguns questionamentos feitos por diferentes pessoas sobre o Novo Acordo Ortográfico foram respondidos por José Pereira da Silva, pesquisador e professor da UERJ.
Aqui, você terá a oportunidade de ler esses questionamentos e respostas ficando por dentro do assunto e tirando suas prováveis dúvidas.

O sistema educacional terá mais facilidade para ensinar os alunos? Será que essa forma não os deixará mais confusos e dispersos da escrita?

Um sistema ortográfico mais simplificado e mais lógico facilita a tarefa do professor e do aluno. Há regras ortográficas que não têm qualquer lógica lingüística e que os professores são obrigados a fazer seus alunos decorarem a regra sem lhes oferecer uma explicação lógica, como é o caso do acento circunflexo nos hiatos -ôo e -êem, por exemplo.
A eliminação do uso do trema nos grupos güe, güi, qüe e qüi vai facilitar a vida dos estudantes e dos professores, assim como a eliminação de vários acentos diferenciais que ainda prevaleceram na língua.

Os livros e dicionários sofreram mudanças. Como o senhor acha que as pessoas se adaptarão já que estão acostumadas com os acentos?

Com dificuldades. As pessoas têm dificuldades para se adaptar com qualquer coisa nova. Todo o mundo se acomoda ao que já conseguiram e fica muito chateado quando descobre que o que tinha não era de boa qualidade e que o que apareceu agora é muito melhor.

Para as pessoas que prestam concursos essas mudanças tornarão as provas mais difíceis?

De maneira alguma, Mônica. As novas regras ortográficas são mais simplificadas que as anteriores. Além disso, fique tranqüila. Somente em 2012 a escola pública vai começar a utilizar o novo sistema ortográfico no ensino fundamental e médio. Como esses cursos terão uma duração mínima de três anos, só em 2015 tais normas serão cobradas em concursos públicos, exceto, naturalmente para os profissionais do ensino e para os profissionais da comunicação escrita.
Além disso, os erros ortográficos correspondem, hoje, nas avaliações lingüísticas a mais da metade dos erros cometidos pelos alunos e profissionais. Aumentar isto é bastante difícil.

Como o senhor acha que a sociedade encarará tal reforma?

Depende do que você chama de sociedade.
A língua escrita padrão é cobrada apenas de uma elite muito selecionada, que corresponde a pessoas que tenham curso superior e somente em algumas especialidades. Nem o médico, nem o engenheiro, nem o técnico em geral será cobrado quanto a isto. Nunca foi.
O cidadão comum, que corresponde a quase noventa por cento da sociedade, nem perceberá que houve alteração. Primeiro, porque já não sabiam as regras atuais de ortografia; depois, porque isto não lhes fará falta.

Segundo alguns sites de informações sobre as novas regras da Língua Portuguesa filólogos são a favor e editores não, da reforma. Porque?

É balela. Ninguém é favor de acordo nenhum. Qualquer acordo significa negociação em que ambas as partes perdem para chegarem a um meio termo possível ou tolerável.
Se houver um "acordo" em que uma parte ficar plenamente satisfeita, o nome seria "ditadura" ou "imposição". Acordo é negociação quando não é possível convencer uma das partes a aceitar inteiramente a proposta da outra.
Talvez seja até o contrário, em termos estatísticos. Os filólogos e lingüistas estavam todos esperando um acordo que simplificasse definitivamente o nosso sistema ortográfico, mas isto não foi possível porque houve muita resistência em alguns grupos.
Entenda que a língua portuguesa é uma das mais faladas no mundo e está espalhada em oito países como língua oficial, além de dezenas de outros como segunda língua.
Os editores, em sua maioria, terão até vantagens, visto que a maioria dos livros é vendida em dois ou três anos e o custo da produção de um livro é de apenas 25% do seu custo de mercado.
Livros como a Biblia, por exemplo, podem ser lidos em qualquer ortografia, pois isto não afetará em nada sua compreensão nem os seus objetivos.
Já percebeu que a Bíblia, na versão mais popularizada entre os evangélicos, tem uma linguagem bem arcaica?
A maioria das pessoas não gostam da idéia de uma nova ortografia. O que o senhor diria a elas sobre essa questão?

A maioria das pessoas não gosta nem sabe o que é a nova ortografia. Nem a velha.
Você sabe utilizar corretamente o hífen nas palavras compostas com as regras que você já estudou (ou deveria ter estudado) na escola? Você usa corretamente o trema e o acento grave nas situações que a ortografia atual exigem?
Estou tratando de uma estudante interessada no assunto. Imagine o que acontece com um estudante de Matemática, Biologia, Química, Física, Medicina, Engenharia etc.
Professores terão que ter aulas, antes, para ensinar seus alunos? Como o senhor acha que será esse processo?

É óbvio. O Espírito Santo não infundirá em cada um deles o conhecimento das novas regras ortográficas nem teria tempo para isto. Atualizar-se profissionalmente faz parte da vida de qualquer pessoa que se especializa em qualquer coisa. Hoje, quem não se recicla em sua profissão está perdendo o emprego desde o momento em que tomar posse dele.
Esse processo será como qualquer outra reciclagem. Uma ferramenta ultrapassada pela tecnologia pode ser reciclada ou virar lixo. É assim também com os profissionais de hoje, muito mais do que era nos tempos em que a história avançava em passos de tartaruga. Hoje, tudo tem a velocidade da eletrônica.
Quando acontecerá, de verdade, as mudanças ortográficas? Por que só agora decidiram colocar em prática?

Já estão acontecendo. Os profissionais do ensino de Letras já têm gramáticas, dicionários e livros especializados que lhes oferecem informações a este respeito.
A Academia Brasileira de Letras está terminando de preparar o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa para servir de base para os pesquisadores mais detalhistas e para resolver as questões que dependerão de um árbitro.
Por que só agora decidiram colocar em prática?!... Porque tudo tem o seu tempo. O projeto da simplificação ortográfica teve início em 1986, foi aprovado em 1990, passou por negociações políticas e acadêmicas desde aquela época, inclusive com inclusão de mais um país (o Timor Leste) entre os que o negociaram inicialmente. A partir de primeiro de janeiro de 2007, com a assinatura de três países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, o Acordo está oficialmente em vigor, mas isto não basta, pois a sua implementação depende de decisões políticas que demandam muito investimento.
A implementação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa depende de reciclagem do professorado, depende de aquisição de livros didáticos e paradidáticos para todas as escolas públicas do país e, neste caso, a negociação com as editoras e com os autores tem de ser feita com um bom prazo de antecedência, porque não apenas umas centenas de livros, mas muitos milhões deles.
Com a ratificação as nações ficaram mais unidas, já que facilitará a linguagem internacionalmente
Você pensou em fazer uma pergunta ou é uma declaração?
A cooperação entre os países de língua portuguesa será facilitada, pois uma editora poderá produzir uma grande quantidade de livros e, barateando o custo da produção, poderá vendê-los ou doá-los para os países mais pobres.
Antes desse Acordo, o Brasil doou alguns milhares de livros a um país africano de língua portuguesa e, depois de avaliados por uma consultoria local, foram proibidos de circular porque atrapalharia a aprendizagem da língua portuguesa ali, visto que sua ortografia diverge da nossa.
Os livros portugueses poderão circular mais facilmente no Brasil, assim como os brasileiros poderão ser consumidos em qualquer país do mundo do mesmo modo.
Se outro banqueiro brasileiro for preso na Europa, não será mais necessário traduzir os documentos do português do Brasil para eles, pois o português é uma das línguas oficiais da União Européia.
Os cursos de língua portuguesa para estrangeiros serão facilitados por uma ortografia unificada, assim como o ensino a distância da língua terá muito maior sucesso pois o material didático será idêntico para qualquer um dos países. Veja que os portugueses também terão vantagens, pois o português é segunda língua em todo o Mercosul, além do fato de que nossas novelas difundem o português em todo mundo, enquanto Portugal não tem a mesma penetração midiática.
Enfim. Há muitas vantagens e muitas desvantagens.
As desvantagens são de curta duração, pois, na próxima geração, todos os estudantes de hoje já terão assimilado essa nova ortografia, enquanto o progresso da humanidade não é concluído ao final de cada geração.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Educação ou capitalismo?



"O que acontece não acontece tanto porque alguns o queiram, mas porque a massa dos homens abdica de sua vontade, deixa fazer, deixa enrolarem os nós que, depois, só a espada poderá cortar; deixa promulgar leis que, depois, só a revolta fará anular; deixa subir ao poder homens que, depois, só uma sublevação poderá derrubar."

(GRAMSCI)




SOCIALIZAÇÃO DA POLÍTICA: O PAPEL DA EDUCAÇÃO


GALVÃO, Roberto Carlos Simões(1)


No Brasil a participação do povo no poder tem se limitado a comparecer nas urnas de dois em dois anos. Mesmo na ocasião dos pleitos eleitorais há pessoas que participam mais por temor às sanções à abstenção do que por consciência crítica ou motivações propriamente políticas. A partir desse contexto, a ideologia neoliberal credita à educação escolar a tarefa de formar cidadãos mais ativos e politicamente conscientes. Pesquisa realizada pelo Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá propôs um estudo crítico do tema em relevo, à luz de referenciais teóricos marxistas, buscando questionar até que ponto a vinculação entre educação e participação política é pertinente e pode se viabilizar. Partiu-se do pressuposto de que a formação da consciência crítica dá-se na práxis da luta de classes, associada a uma educação socialista emancipatória, formadora do homem omnilateral. Sob o modo de produção capitalista, a escola não passa de um aparelho ideológico do Estado, cujo fim está na manutenção e na reprodução da ordem social burguesa. As propostas de educar para a cidadania nas escolas não farão grande diferença, enquanto a sociedade estiver pautada numa política econômica de orientação capitalista, essencialmente fundamentada na desigualdade, e que obstaculiza as ações populares revolucionárias.


(1) Professor de Filosofia na região norte do Paraná (Rede Particular de Ensino). Graduado em Direito e Filosofia; Pós-graduado em Filosofia pela Universidade Estadual de Londrina; Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá. Autor de artigos publicados em revistas especializadas. E-mail: rcsgalvao@bol.com.br Telefone: (43) 3422-2074.


*Para ler este artigo completo, acesse: http://www.reveduc.ufscar.br/index.php?option=com_content&task=view&id=45&Itemid=48 .


segunda-feira, 10 de novembro de 2008

REDAÇÃO - conheça alguns princípios básicos para uma boa correção

Fazer da correção de texto um ato de prazer

Princípios básicos:
1. O erro é uma oportunidade para que se dê o processo ensino-aprendizagem. Não fazer drama em cima do erro do aluno: banho de sangue.
2. Ninguém erra voluntariamente. Não inibir o aluno de escrever, mesmo que erre muito.
3. Escrever para alguém corrigir é uma situação artificial. Ninguém escreve para as gavetas. A função social da linguagem.
4. Uma boa correção começa numa proposta de redação bem elaborada. Estabelecer critérios previamente.
5. Discutir o conteúdo, mas privilegiar a forma.
6. A importância do rascunho. A necessidade de um portador. Reescrita do texto avaliado.
7. Fazer exercícios microestruturais: estruturação do período e do parágrafo.
8. A obediência às regras da Gramática Normativa é apenas um aspecto a ser avaliado, não é tudo.

Curiosidade




Aí por volta de 1910 não havia rádio nem televisão, e o cinema chegava ao interior do Brasil uma vez por semana aos domingos. As notícias do mundo vinham pelo jornal, três dias depois de publicadas no Rio de Janeiro. Se chovia, a mala do correio aparecia ensopada, uns sete dias mais tarde. Não dava para ler o papel transformado em mingau.
Papai era assinante da Gazeta de Notícias, e antes de aprender a ler eu me sentia fascinado pelas gravuras coloridas do suplemento de Domingo. Tentava decifrar o mistério das letras em redor das figuras, e mamãe me ajudava nisso. Quando fui para a escola pública, já tinha a noção vaga de um universo de palavras que era preciso conquistar.
Durante o curso, minhas professoras costumavam passar exercícios de redação. Cada um de nós tinha de escrever uma carta, narrar um passeio, coisas assim. Criei gosto por esse dever, que me permitia aplicar para determinado fim o conhecimento que ia adquirindo do poder de expressão contido nos sinais reunidos em palavras.
Daí por diante, as experiências foram se acumulando sem que eu percebesse que estava descobrindo a leitura. Alguns elogios da professora me animavam a continuar. Ninguém falava em conto ou poesia, mas a semente dessas coisas estavam germinando. Meu irmão, estudante na Capital, mandava-me revistas e livros, e me habituei a viver entre eles. Depois, já rapaz, tive sorte de conhecer outros rapazes que também gostavam de ler e escrever.
Então começou uma fase muito boa de troca de experiências e impressões. Na mesa do café-sentado (pois tomava-se café sentado nos bares e podia-se conversar horas e horas sem incomodar nem ser incomodado), eu tirava do bolso o que escrevera durante o dia e meus colegas criticavam. Eles também sacavam seus escritos e eu tomava parte nos comentários. Tudo com naturalidade e franqueza. Aprendi muito com os amigos e tenho pena dos jovens de hoje que não desfrutam desse tipo de amizade crítica.

(Carlos Drumond de Andrade)

Poemas e textos - 2ª PARTE

Para você, professor, separamos nesta postagem alguns textos com comentários para o auxílio de sua prática docente.
A arte de ser feliz
(Cecília Meireles)

Houve um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa e sentia-me completamente feliz.
Houve um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flores. Para onde iam aquelas flores? Quem as comprava? Em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebê-las? Eu não era mais criança, porém minha alma ficava completamente feliz.
Houve um tempo em que a minha janela se abria sobre uma cidade que parecia feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega; era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas d’água que caiam de seus dedos magros, e meu coração ficava completamente feliz.
Houve um tempo em que a minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histórias. Eu não a podia ouvir, da altura da janela e mesmo que a ouvisse, não a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto, e às vezes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu participava do auditório, imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz.
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

*A autora fala de um tempo de sua vida em que era muito feliz. Provavelmente, porque era mais jovem e tinha outra visão de tudo a sua volta.
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Saber Viver
Não sei... Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura... Enquanto durar
*O poema aborda a importãncia de valorizar a vida e as pessoas que estão em torno de nós.

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Tecendo a Manhã
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

*O autor trata, de uma maneira peculiar, da necessidade que temos uns dos outros, ninguém vive só.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Como mostrar a importância da pontuação aos alunos

A importância da pontuação
(Hélio Consolaro* )


Recebi de um leitor (login: rondon.jr) um texto bastante conhecido, antigo, como exemplo de como a pontuação faz a diferença. A reprodução abaixo não é falta de assunto, mas uma forma de compartilhar com os leitores mais jovens as coisas antigas e boas que estão na internet.
Um homem rico estava muito doente, pediu papel e caneta, e assim escreveu: "Deixo meus bens à minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do alfaiate nada aos pobres".
Morreu antes de fazer a pontuação. Para quem ele deixava a fortuna?
Eram quatro concorrentes. O sobrinho fez a seguinte pontuação: "Deixo meus bens à minha irmã? Não, a meu sobrinho. Jamais será paga a conta do alfaiate. Nada aos pobres." A irmã chegou em seguida e pontuou assim, o escrito: "Deixo meus bens à minha irmã, não a meu sobrinho. Jamais será paga a conta do alfaiate. Nada aos pobres."
O alfaiate pediu cópia do original e puxou a brasa pra sardinha dele: "Deixo meus bens à minha irmã? Não! Ao meu sobrinho jamais! Será paga a conta do alfaiate. Nada aos pobres." Aí, chegaram os descamisados da cidade. Um deles, sabido, fez esta interpretação: "Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho jamais! Será paga a conta do alfaiate? Nada! Aos pobres."


MORAL DA HISTÓRIA
Pior de tudo é saber que ainda tem gente que acha que uma vírgula não faz a menor diferença!


*Hélio Consolaro é professor de Português, cronista diário da Folha da Região, Araçatuba-SP, presidente da Academia Araçatubense de Letras, coordenador do site Por Trás das Letras.

Veja como a gramática ajuda na boa comunicação

A gramática ajuda viver
A linguagem dirige os pensamentos para direções específicas e, de alguma forma, ela ajuda a pessoa criar a sua realidade, potencializando ou limitando suas possibilidades. A habilidade de usar a linguagem, com precisão, é essencial para uma boa comunicação e para o sucesso. Aqui a gramática cruza com a vida.


1) Cuidado com a palavra "não". A Frase que contém "não", para ser compreendida, traz à mente o que está junto com ela. O "não" existe apenas na linguagem e não na experiência.
Se pedir a uma pessoa que não pense na cor vermelha, ela pensou sem querer, apesar da negativa, por isso procure falar no positivo, naquilo que quer e não naquilo que não quer.

2) Cuidado com a conjunção adversativa "mas", que nega tudo que veio antes. Por exemplo: "O Pedro é um rapaz inteligente, esforçado, mas...". Substitua "mas" por "e", mude a construção da frase.

3) Cuidado com o verbo "tentar", que pressupõe a possibilidade de falha. Por exemplo: "Vou tentar encontrar com você amanhã às 8 h". Em outras palavras: a pessoa tem grande chance de não ir, pois vai "tentar". Evite "tentar", "farei o possível", diga sim ou não.

4) Cuidado com "não posso" ou "não consigo", que dão idéia de incapacidade pessoal. Use "não quero", "não podia" ou "não conseguia", que pressupõe que vai conseguir, que vai poder .

5) Cuidado com os verbos "devo", "tenho que" ou "preciso", que pressupõem que algo externo controla a sua vida. Em vez deles use "quero", "decido", "vou".

6) Fale dos problemas ou das descrições negativas de si mesmo, utilizando o verbo no passado. Isso libera o presente. Por exemplo: "Eu tinha dificuldade em fazer isto..."

7) Fale das mudanças desejadas para o futuro, utilizando o tempo presente. Por exemplo: em vez de dizer "Vou conseguir", diga "Estou conseguindo".

8) Substitua o "se" por "quando". Por exemplo: em vez de falar "Se eu conseguir ganhar dinheiro, vou viajar", fale "Quando eu conseguir ganhar dinheiro vou viajar".

9) Substitua "espero" por "sei". Por exemplo: em vez de falar "Eu espero aprender isso", diga "Eu sei que vou aprender isso". Esperar suscita dúvidas e enfraquece a linguagem.

10) Substitua o futuro do pretérito pelo presente. Por exemplo: Em vez de dizer "Eu gostaria de agradecer a presença de vocês", diga "Eu agradeço a presença de vocês". O verbo no presente fica mais forte e concreto.

(Estas dez recomendações fazem parte de sites de consultorias de marketing e relacionamento humano. Não aparece o nome do autor. Reproduzido com adaptações.)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Pronomes de tratamento - algumas curiosidades

Breve história dos pronomes de tratamento

O uso de pronomes e locuções pronominais de tratamento tem larga tradição na língua portuguesa. De acordo com Said Ali, após serem incorporados ao português, os pronomes latinos tu e vos, "como tratamento direto da pessoa ou pessoas a quem se dirigia a palavra", passou-se a empregar, como expediente lingüístico de distinção e de respeito, a segunda pessoa do plural no tratamento de pessoas de hierarquia superior. Prossegue o autor: "Outro modo de tratamento indireto consistiu em fingir que se dirigia a palavra a um atributo ou qualidade eminente da pessoa de categoria superior, e não a ela própria. Assim aproximavam-se os vassalos de seu rei com o tratamento de vossa mercê, vossa senhoria(...); assim usou-se o tratamento ducal de vossa excelência e adotaram-se na hierarquia eclesiástica vossa reverência, vossa paternidade, vossa eminência, vossa santidade." A partir do final do século XVI, esse modo de tratamento indireto já estava em voga também para os ocupantes de certos cargos públicos. Vossa mercê evoluiu para vosmecê, e depois para o coloquial você. E o pronome vós, com o tempo, caiu em desuso. É dessa tradição que provém o atual emprego de pronomes de tratamento indireto como forma de dirigirmo-nos às autoridades civis, militares e eclesiásticas.
(Manual de Redação da Presidência da República)

Conheça um pouco da história do autor do nosso “amigo” Aurélio

Quem foi Aurélio Buarque de Holanda Ferreira?
(Gentileza Academia Brasileira de Letras)

Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, crítico, ensaísta, tradutor, filólogo e lexicógrafo, nasceu em Passo de Camaragibe, AL, em 2 de maio de 1910, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 28 de fevereiro de 1989. Eleito em 4 de maio de 1961 para a Cadeira n. 30, na sucessão de Antônio Austregésilo, foi recebido em 18 de dezembro de 1961, pelo acadêmico Rodrigo Otávio Filho.
Filho de Manuel Hermelindo Ferreira, comerciante, e de Maria Buarque Cavalcanti Ferreira. Passou parte da infância em Porto das Pedras, AL, e estudou as primeiras letras em Maceió. Fez os preparatórios no Liceu Alagoano. Aos 15 anos ingressou no magistério e passou a se interessar pela língua e literatura portuguesas. Diplomou-se em Direito pela Faculdade do Recife, em 1936. Em 1930 fez parte de um grupo de intelectuais que exerceria forte influência literária no Nordeste, entre outros, Valdemar Cavalcanti, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Raul Lima, Rachel de Queiroz. Em 1936 e 1937, foi professor de Português, Literatura e Francês no Colégio Estadual de Alagoas, e em 1937 e 1938, diretor da Biblioteca Municipal de Maceió.
Passou a residir no Rio de Janeiro a partir de 1938. Continuou no magistério, como professor de Português e Literatura Brasileira no Colégio Anglo-Americano em 1939 e 1940; professor de Português no Colégio Pedro II, de 1940 a 1969, e professor de Ensino Médio do Estado do Rio de Janeiro, de 1949 a 1980. Contratado pelo Ministério das Relações Exteriores, exerceu a cátedra de Estudos Brasileiros na Universidade Autônoma do México, de junho de 1954 a dezembro de 1955.
Colaborou na imprensa carioca, escrevendo contos e artigos. Foi secretário da Revista do Brasil (3a fase), quando era seu diretor Otávio Tarquínio de Sousa, de 1939 a 1943. Nessa época, evidenciava-se o escritor, nos contos de Dois mundos, livro publicado em 1942 e premiado em 1944 pela Academia Brasileira de Letras, e no ensaio "Linguagem e estilo de Eça de Queirós", publicado em 1945. Em 1941 começou Aurélio Buarque a atividade que o iria absorver a vida inteira e que, de certa forma, iria suplantar o Aurélio escritor: o Aurélio dicionarista. Foi quando o convidaram a executar, pela primeira vez, um trabalho lexicográfico, como colaborador do Pequeno dicionário da língua portuguesa. Em janeiro de 1945, tomou parte no I Congresso Brasileiro de Escritores, realizado em São Paulo.
As múltiplas atividades de professor, lexicógrafo e de verdadeiro colaborador nas obras de seus amigos escritores valeram-lhe, desde aquela época, o título de "Mestre". Em 1947, iniciou no Suplemento Literário do Diário de Notícias a seção "O Conto da Semana", que durará até 1960 e, a partir de 1954, terá a colaboração de Paulo Rónai. Essa colaboração entre os dois amigos vinha desde 1941, quando se conheceram na redação da Revista do Brasil, e se concretizou no trabalho conjunto dos cinco volumes da coleção Mar de histórias, antologia do conto mundial, o primeiro deles publicado em 1945.
A partir de 1950 Aurélio Buarque manteve, na revista Seleções do Reader’s Digest, a seção "Enriqueça o seu vocabulário", que em 1958 ele irá reunir e publicar no volume de igual título. Em 1963, tomou parte, em Bucareste, representando a Academia, no Simpósio de Língua, História, Folclore e Arte do Povo Romeno, visitando na mesma ocasião a Bulgária, Iugoslávia, Tchecoslováquia e Grécia. Foi membro da Comissão Nacional do Folclore e da Comissão Machado de Assis.
A preocupação pela língua portuguesa, a paixão pelas palavras levou-o à imensa tarefa de elaborar o seu próprio dicionário, e esse trabalho lexicográfico ocupou-o durante muitos anos. Finalmente, em 1975, saiu o Novo dicionário da língua portuguesa, conhecido por todos como o dicionário Aurélio. Desde a sua publicação, Mestre Aurélio atendeu a muitos convites, no Brasil inteiro, para falar do Dicionário e dos mistérios e sutilezas da língua portuguesa, que ele enriqueceu de tantos brasileirismos, fazendo do brasileiro comum um consulente de dicionário e um usuário consciente do seu idioma. Pronunciou numerosas conferências, sobre assuntos literários e lingüísticos, no México, Estados Unidos, Cuba, Guatemala e Venezuela.
Pertenceu à Associação Brasileira de Escritores, seção do Rio de Janeiro (1944-49). Era membro da Academia Brasileira de Filologia, do Pen Clube do Brasil, do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, da Academia Alagoana de Letras e da Hispanic Society of America.
Obras: Dois mundos, contos (1942); "Linguagem e estilo de Eça de Queirós", in Livro do centenário de Eça de Queirós (1945); Mar de histórias (Antologia do conto mundial), em colaboração com Paulo Rónai, I vol. (1945); II vol. (1951); III vol. (1958); IV vol. (1963); V vol. (1981); Contos gauchescos e lendas do sul, de Simões Lopes Neto. Edição crítica, com amplo estudo sobre a linguagem e o estilo do autor (1949); O romance brasileiro (de 1752 a 1930), história literária (1952); Roteiro literário do Brasil e de Portugal (Antologia da língua portuguesa), em colaboração com Álvaro Lins (1956); Território lírico, ensaios (1958); Enriqueça o seu vocabulário, filologia (1958); Vocabulário ortográfico brasileiro (1969); O chapéu de meu pai, edição revista e reduzida de Dois mundos (1974); Novo dicionário da língua portuguesa (1975); Minidicionário da língua portuguesa (1977). Além dos contos que traduziu para a coleção Mar de Histórias, Aurélio Buarque de Holanda traduziu romances de vários autores, os Poemas de amor, de Amaru, e os Pequenos poemas em prosa, de Charles Baudelaire.

Dia Nacional da Língua Portuguesa

HOJE, DIA 05 DE NOVEMBRO, É O
DIA NACIONAL DA LÍNGUA PORTUGUESA!
(Instituído pela lei Nº 11.310, de 12 de junho de 2006)


Você, falante da nossa língua, COMEMORE COM HONRAS ÀQUELA QUE FAZ PARTE DO NOSSO COTIDIANO!

Textos e poemas sobre a Língua Portuguesa


Se você é professor de Língua Portuguesa e deseja trabalhar em sala com a Literatura que fala da nossa língua, veja alguns textos que separamos para auxiliar sua prática docente.




LÍNGUA PORTUGUESA
(Olavo Bilac)

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amote assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
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Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são para mim corpos tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas. Talvez porque a sensualidade real não tem para mim interesse de nenhuma espécie - nem sequer mental ou de sonho -, transmudou-se-me o desejo para aquilo que em mim cria ritmos verbais, ou os escuta de outros. Estremeço se dizem bem. Tal página de Fialho, tal página de Chateaubriand, fazem formigar toda a minha vida em todas as veias, fazem-me raivar tremulamente quieto de um prazer inatingível que estou tendo. Tal página, até, de Vieira, na sua fria perfeição de engenharia sintáctica, me faz tremer como um ramo ao vento, num delírio passivo de coisa movida.
Como todos os grandes apaixonados, gosto da delícia da perda de mim, em que o gozo da entrega se sofre inteiramente. E, assim, muitas vezes, escrevo sem querer pensar, num devaneio externo, deixando que as palavras me façam festas, criança menina ao colo delas. São frases sem sentido, decorrendo mórbidas, numa fluidez de água sentida, esquecer-se de ribeiro em que as ondas se misturam e indefinem, tornando-se sempre outras, sucedendo a si mesmas. Assim as ideias, as imagens, trémulas de expressão, passam por mim em cortejos sonoros de sedas esbatidas, onde um luar de ideia bruxuleia, malhado e confuso.
Não choro por nada que a vida traga ou leve. Há porém páginas de prosa que me têm feito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noite em que, ainda criança, li pela primeira vez numa selecta o passo célebre de Vieira sobre o rei Salomão. "Fabricou Salomão um palácio..." E fui lendo, até ao fim, trémulo, confuso: depois rompi em lágrimas, felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquele movimento hierático da nossa clara língua majestosa, aquele exprimir das ideias nas palavras inevitáveis, correr de água porque há declive, aquele assombro vocálico em que os sons são cores ideais - tudo isso me toldou de instinto como uma grande emoção política. E, disse, chorei: hoje, relembrando, ainda choro. Não é - não - a saudade da infância de que não tenho saudades: é a saudade da emoção daquele momento, a mágoa de não poder já ler pela primeira vez aquela grande certeza sinfónica.
Não tenho sentimento nenhum político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa . Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incomodassem pessoalmente. Mas odeio, com ódio verdadeiro, com o único ódio que sinto, não quem escreve mal português, não quem não sabe sintaxe, não quem escreve em ortografia simplificada, mas a página mal escrita, como pessoa própria, a sintaxe errada, como gente em que se bata, a ortografia sem ípsilon, como o escarro directo que me enoja independentemente de quem o cuspisse.
Sim, porque a ortografia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-ma do seu vero manto régio, pelo qual é senhora e rainha.

("Livro do Desassossego", por Bernardo Soares. Vol. I, Fernando Pessoa.)
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SONETO À LÍNGUA PORTUGUESA

Havia luz pela amplidão suspensa
no azul do céu, vergéis e coqueirais...
e o Lácio, com fulgores divinais,
abrigava de uma virgem a presença...
Era um castelo de ouro, amor e crença,
que igual não houve, nem haverá jamais...
Onde os poetas encontraram ideais
na poesia nova, n'alegria imensa...

A virgem era a Língua portuguesa,
a mais formosa e divinal princesa,
vivendo nos vergéis de suave aroma!

Donzela meiga que, deixando o Lácio,
abandona os umbrais do seu palácio,
para ser de um povo o glorioso idioma!...

(Publicado no Livro Gota de Orvalho, de Waldin de Lima, poeta gaúcho, no ano de 1989)
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SEMENTE DO DESERTO
(Humberto de Campos)

No alto sertão da minha terra
Cai, misteriosa, uma semente
Que a outras sementes move guerra.

onde ela nasce, de repente,
— Seara de mão cruel e ignota —
A relva murcha, suavemente.

E nas planícies onde brota,
E onde nem sempre é conhecida,
Toda a campina se desbota...

(Semente bárbara e remota,
Quem te semeou na minha vida?)